Tenho dois. Não me lembro da vida sem eles. Tinha dois anos quando nasceu a minha irmã e ia a caminho dos cinco quando nasceu o meu irmão. Não consigo imaginar uma vida sem eles. Como dizia a minha amiga C., a comunicação entre irmãos acontece bem mais por outras vias do que por palavras. Mas há momentos em que as palavras ganham força. Não há quem nos conheça melhor, nos compreenda e conforte tão bem. São quem cresceu connosco, brincou, brigou, arrancou cabelos. São os que nos chateiam, põem fora de nós, fazem-nos perder as estribeiras. São também os nossos maiores protetores e quem mais queremos proteger. Os que nos aceitam genuinamente pelo que somos, sem julgamentos, cobranças ou exigências. Numa simplicidade única de ser. Com eles sonhamos e criamos projetos. Com eles reclamamos do pai e da mãe. São os únicos a conhecer verdadeiramente as dinâmicas familiares, a viver das suas regalias de igual forma, mas também a ultrapassar os desafios e a partilhar as angústias e dramas que só se vivem dentro da casa de cada um. É com eles que mais rimos. É neles que buscamos conforto. Que temos garantido um lugar no sofá em dias difíceis. É com eles que queremos partilhar e celebrar as nossas vitórias. Com eles crescemos e nos moldamos naquilo que nos tornamos na vida adulta e voltamos a sentir-nos crianças quando juntos estamos. São eles que nos olham além do que se vê. Que nos ouvem com a máxima atenção. E apesar das semelhanças no ADN partilhado e nos valores transmitidos, é nas diferenças que nos encontramos e nos conjugamos num puzzle de complementaridade perfeita, como não se encontra igual. Imaginamos a vida toda com eles do nosso lado, partilhando natais, aniversários, convívios. Vê-los criar as suas famílias e fazer a nossa crescer. Vê-los vingar nos seus sonhos, acompanhá-los e guiá-los. Mas a vida tem esta incoerência de nos pregar partidas quando menos esperamos e nos deixam sem chão, fazendo-nos questionar a razão pela qual aqui permanecemos neste mundo. Hoje é um dia triste. Hoje foi a cerimónia do adeus do irmão da minha melhor amiga, muito antes de ser expectável. Uma despedida dura de um jovem que tinha ainda muito para dar. E hoje faz também um ano que a vida foi levada ao tio M.J., cedo demais, também ele deixando as suas irmãs em Terra. Sou amiga da C. há quase duas décadas, acompanhando a sua família desde então. Conheço o P. desde pequenino. Cresci vendo as suas conquistas e derrotas, superações e desafios, através dela. Cresci vendo crescer o P., a conquistar sonho atrás de sonho, numa intensidade única de viver. Conheci-o pela C., no orgulho que tinha por ele, na sua relação próxima e descomplicada, divertida, única e simples, na partilha de momentos vários. No brilhar do seus olhos sempre que falava do irmão mais novo, sempre preocupada e atenta ao seu presente e futuro. Deixou-nos aos 27 anos. Brilharão os olhos desta família sempre que falarem do P., sempre que for por alguém lembrado, no sempre que permanecerá no coração de todos os que perderam um pouco de si com a sua partida. Que possam todos ir buscar forças onde pensam não existir, nas memórias infinitas com que vos deixa o P.. Que possam continuar a viver, apesar do pedaço que arrancaram de vós. Que possam continuar a acreditar em algo além do compreensível para aceitar e aprender a conviver com a dor que convosco permanecerá. Que permitam que vos segurem e vos ajudem a carregar o vazio, preenchendo-o com o resto que vos falte. Que não percam a capacidade de sonhar, de receber, abraçar e acolher todos aqueles que gostam de vocês e vos querem bem, como vos é característico enquanto família. P., prometo ajudar a nossa C. a percorrer este vazio que será a tua ausência, tentando que continue em busca do seu próprio caminho e que encontre sempre o caminho até ti. A. e R., prometo assumir a missão de irmã desta amiga de uma vida que me deram, para que possam descansar seguros de que mais alguém estará sempre a olhar por ela. É com um carinho muito especial por todos vocês, que deixo este meu testemunho. À minha Catarina, para sempre a irmã protetora e protegida do/pelo seu Pedro 💫 Termino o meu tributo aos irmãos, a quem raramente dizemos o que sentimos verdadeiramente, lembrando o quanto os amamos, admiramos e estamos gratos por tê-los na nossa vida, por fazerem uma tão grande parte de quem somos hoje. Aos que têm irmãos já levados para dimensões que desconhecemos, que tenham fé num futuro reencontro enquanto se seguram à restante família para por aqui continuar a viver e a sorrir. Aos meus, gosto muito de vocês 🤍
19.06.2022
Comments