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Foto do escritorCarolina Germana

Ilha dourada


(Fotografia minha)


Não sei se por momentos, lá para março, nos ter passado pela cabeça que o mundo ia acabar, que não íamos ter férias ou verão ou que não íamos reunir amigos ou família, as expetativas eram naturalmente baixas. Mas este ano, a ilha dourada, mais brilhante estava. Este lugar sagrado, que tanto nos representa, foi onde tudo fácil e bem ficou neste ano atípico de 2020.


As férias souberam mais a verão que nunca, com os pés bem enterrados na areia, com a moldar do corpo deitado na praia, com o som e o cheiro das ondas a rebentar. Com a temperatura do mar que sabe a banho e as mil tonalidades de azul que pintam o quadro dos nove quilómetros de areal. Com os figos e os tabaibos da ilha a saciarem e deliciarem a tarde, o copo de sidra ao final do dia ao som da música no bar da praia, com o bolo do caco, milho frito e bife de atum ao jantar e a famosa “lambeca” de sobremesa.


Soube mais a verão que nunca estar de óculos de sol na cara e cabelo ao vento, entre curva e contracurva de mota, a dar a volta à ilha. A render-nos às vistas dos seus miradouros, às suas paisagens áridas e à água límpida e transparente das suas piscinas naturais, num azul turquesa em labirinto por entre rochas.


Soube mais a verão que nunca, a noite quente que se prolongou até de manhã, com amigos reunidos a dançar até doerem os pés, a despedirmo-nos da lua e a abraçarmos o sol que clareava os céus, ao som de Friends will be Friends dos Queen, entre abraços, gargalhadas de fazer doer a barriga e sorrisos rasgados de orelha a orelha.


Soube mais a verão que nunca, a sandes de polvo de escabeche às 9h no “Golfinho”, a relembrar os clássicos finais de noites de verão da nossa adolescência, que fizemos questão de repetir.


Com menos de dez casos desde o início da pandemia, este cantinho do céu permitiu-nos entrar numa bolha que não sonhávamos poder existir há cinco meses atrás. E não sei se por ter passado este período entre dúvidas, incertezas e angústias, por me ter sentido triste, receosa e com medo, por ter estado afastada de amigos e família ou por ter tido um trabalho que exigiu de mim mais do que pensava poder dar, que estas duas semanas de férias e em especial esta ilha mágica no meio do atlântico, me permitiu uma felicidade e uma serenidade plenas e uma gratidão imensa.


É dia de regresso. Últimos mergulhos no mar, última sidra de pé na areia fina, últimos raios de sol quentes a aquecer a alma. Seguimos viagem. Observo o barco a atravessar as ondas e sinto a maresia. Com a silhueta das montanhas da Madeira de fundo, rodeada de azul, o sol mergulha no mar e o céu vira fogo, a jeito de despedida.


É hora de voltar à luta. Dos dias. Já dizia Saramago, que "é preciso sair da ilha para se ver a ilha" e que "não nos vemos se não saímos de nós”.


Saindo de mim, para ver mais de mim. Em ciclo. Como nova para receber mais um.


Até já!

 

Diário de uma pandemia 15.08.2020

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