Janeiro de 2021.
Sinto automaticamente um nervosinho no estômago. Há qualquer coisa de reconfortante nesta transição para 2021. Estranho isto de, de um dia para o outro, sentirmos que começamos de novo, pelo recomeçar de janeiro. Apesar de sermos as mesmas pessoas, de o dia ser só mais um, sentimos de tal forma este virar de página que nos propomos a mudar hábitos, atingir novos objetivos e deixamo-nos sonhar novos sonhos.
Mas este ano é especial.
2020 era um ano numericamente bonito. Redondo. Fácil. Promissor. E trocou-nos as voltas. 2021, numericamente falando, não me atrai. Mas deposito nele a responsabilidade de nos devolver tudo aquilo que o ano passado nos tirou e vejo nele a oportunidade de pôr em prática tudo aquilo que o ano passado nos ensinou.
Passei a manhã do último dia do ano com a mãe e a M.. Acordámos cedo, pusemos os nossos tapetes de yoga na rua debaixo de céu azul e com o calor do sol da manhã. Sob os nossos 180 graus de vista mar, iniciámos a nossa prática de transição de ano.
A primeira hora foi dedicada a 2020.
Começámos por repartir a nossa reflexão em quatro áreas diferentes: casa/família, mente, corpo e alma. De forma livre, individual e em silêncio, fomos arrumando por escrito os momentos altos e baixos dentro de cada “gaveta”, deixando-nos levar pelas memórias e emoções que surgiam e se deixavam transportar pela caneta, para o papel. À medida que me fui apercebendo daquilo que me saia de forma espontânea, senti um peso que tive de deitar fora. Um autêntico mix de sensações transformaram-se em lágrimas gordas que escorreram sem pedir licença e só pararam quando me libertei de todas elas. Libertação, foi o que vivi ali, deixando-me literalmente vazia.
Parámos um pouco para nos dar tempo e espaço para passarmos à fase seguinte. A mãe e a M. tiveram um ano bem diferente do meu. Apesar do trigger para tanta mudança em todo o mundo e em todas as vidas de cada um de nós ser comum, sentimo-lo e vivemo-lo de formas tão distintas. É interessante ver em que é que isso se traduziu no final e que tipo de emoções vêm à flor da pele quando nos confrontámos com esta introspeção pessoal.
2020 ensinou-nos a não recear planos falhados, mas sim a sermos flexíveis e a readaptar-nos às circunstâncias. Ensinou-nos a sabermos navegar pelo incerto e que aqueles de quem mais gostamos são a âncora que não nos deixa afundar. Ensinou-nos também que sonhar e acreditar é o que nos permite continuar a superar batalhas. Que ter a esperança no amanhã melhor é o que nos permite ultrapassar o hoje menos bom. É o que nos permite cá continuar a estar, a sentir e a existir. Todo o ano de 2020 foi de um conhecimento e crescimento pessoal sem igual, transformador para muitos nós, a tantos níveis. Vivi-o em pleno, intensamente e saio dele livre.
Com tudo isto em mente, passámos à segunda hora desta prática: 2021.
Traçamos planos porque gostamos de seguir um rumo, para não nos perdermos dos nossos objetivos, para mantermos o foco no nosso propósito. Divagámos pelo ano novo nas mesmas quatro áreas, escrevendo no mínimo 3 intenções que queremos pôr em prática, em cada uma delas. Reescrevi algumas que tinha deixado pensadas há exatamente 12 meses atrás, antes de sabermos que o mundo ia virar pandémico. Muitas escrevi como manutenção daquilo que já iniciei nos últimos meses. Outras totalmente novas. Esta segunda hora de prática trouxe-me não lágrimas, mas sorrisos. Depois do que sobrevivemos, vivemos e lutámos este último ano, não há mais espaço para medo do que virá, da novidade e do futuro. Apenas esperança.
Dei as boas vindas a 2021 a assistir ao espetáculo de fogo de artifício que iluminou a baía e deixei-me envolver pela beleza extraordinária da minha ilha. As primeiras vinte e quatro horas do dia foram passados com os meus mais próximos. Brindámos à saúde e à vida, dançámos e rimos. Abraçámos também alguns, com força.
Acabei o primeiro dia do ano a dar um mergulho no mar e lá fiquei no embalo das ondas a olhar o céu. Grata. Grata pelo que me 2020 me trouxe, pelo que lá deixei ficar e por tudo aquilo que levo comigo para o novo ano. Grata por ter todos os que amo comigo. Grata por este novo início, pelas novas oportunidades, novos desafios e novas conquistas que virão.
Hoje estou de regresso ao retângulo. Aterro neste momento e estou a sentir-me estranhamente bem, em paz e pronta. Pronta para começar 2021 e focar-me em tudo aquilo que pretendo atingir para (continuar) a ser feliz.
2021 é esperança. Encham-se dela.
Comecemos, de novo.
Feliz ano.
Diário de uma pandemia 02.01.2021
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